A Vida de Conformidade Com a Regra da
Graça
Gálatas 6.11-18
Introdução
No último sábado, ouvi uma mensagem
bíblica pregada pelo Rev. Dr. Samuel Logan, presidente emérito do Westminster, no
culto dos 500 anos da Reforma no Mackenzie em São Paulo. Ele falou da história
ilustrando-a como sendo um grande garrafão, um gigantesco garrafão de vidro com
um gargalo bem apertado. Ele diz que tem uma destas garrafas em casa e quando a
vê se lembra de Cristo como sendo o ponto focal para o qual toda a história
aponta. Cada gota de vinho colocada neste garrafão tem um único propósito, um
dia sair por aquele gargalo. Assim ele diz que toda a existência de todas as
coisas tem um único propósito, um dia trazer à luz a glória de Cristo.
Na verdade, podemos, de alguma
forma, buscar algum tipo de proeminência ou protagonismo neste mundo, mas tudo,
absolutamente tudo o que acontece, toda a história, quer a de Martinho Lutero,
Calvino, apóstolo Paulo ou a sua, tudo isto são apenas pequenas gotas de uma
construção que visa, no final de tudo, revelar a glória de Cristo. Você existe
e Deus te criou e te deu uma história de vida porque ele deseja que sua vida
aponte para Cristo.
Existimos para que Cristo seja
glorificado isso é o que afirmamos quando reafirmamos a nossa crença de que o
fim principal do homem é glorificar a Deus. Nossa vida toda, cada minuto, cada mínima
fração da nossa existência é um ato do Criador de trazer glória ao nome de
Cristo, para quem converge todas as coisas. Contudo, devemos considerar
atentamento o fato de que nos inclinamos pecaminosamente a buscar outro ponto
focal para viver e estabelecemos conosco mesmo uma relação de proeminência pessoal
como um modelo de vida.
Em outras palavras, o que o
pecado fez conosco foi mudar nosso centro de interesse existencial
retirando-nos do propósito original e maior de glorificar a Deus e levando o
nosso coração cativo à uma ideia de busca de nós mesmos como ponto de partida existencial.
Existe um perigo eminente para
todos nós e temos de ficar mais atentos para ele. Todos corremos o risco de nos
mover neste mundo guiados pelos nossos interesses com o fim de buscarmos nos
completar em nós mesmos. Paulo viu o que estava acontecendo nas igrejas da
Galácia, quando eles perverteram o Evangelho da Graça, que deveria nos levar
naturalmente a viver segundo as regras da graça que buscam a glória de Cristo,
e se focaram em um outro evangelho, maldito, que os fazia buscar na
autojustiça, na autorrealização, no busca de interesses pessoais o conforto
para sua alma.
O ponto central das observações
de Paulo é que o evangelho falso da autovalorização que eles adotaram não
estava produzindo a vida de Cristo na igreja, mas algo que nada tinha a ver com
Cristo. Aquela igreja não estava mais refletindo a sua unidade com Cristo, ela
não apresentava os sinais característicos de quem vive para Cristo, quem vive segundo
a graça. Por isso, a sua carta está tão permeada de repreensões pastorais neste
sentido. Ele propõe mais que uma reflexão, ele apresenta a eles uma maneira de
se autoavaliarem e se enxergarem. Paulo propõe que eles se meçam pela regra da
graça (o cânon da graça). Por isso, nessa exortação final, que o próprio Paulo
escreve pessoalmente, ele tem algo muito sério a dizer que tem a ver com a
realidade de quem somos e como devemos nos avaliar a partir do que Deus espera
fazer em nós. Eu te convido a pensar sobre essa medida da graça, essa régua que
deveria delinear o que é ser igreja para você. Pense sobre o que a regra da
graça deve gerar em você e se avalie. Ao final, tome uma decisão positiva em
favor de sua vida com Cristo. Ore e seja sábio diante da Palavra.
A Regra da Graça Lança Fora a Busca do
Favorecimento Pessoal
Vede com que letras grandes vos escrevi do meu próprio punho. Todos os que querem ostentar-se na carne, esses vos constrangem a vos circuncidardes, somente para não serem perseguidos por causa da cruz de Cristo. Pois nem mesmo aquele que se deixam circuncidar guardam a lei, antes, querem que vos circuncideis, para se gloriarem na vossa carne. (Gálatas 6. 11-13).
Em geral, estamos preocupados
primeiramente com nossos interesses e depois com o restante. Buscamos, quase
que naturalmente, organizar as coisas de um modo que os acontecimentos nos
favoreçam.
Não estou dizendo que exista
algum erro absoluto nesta postura. Não há! Na verdade, parece-me natural e
saudável que uma pessoa deseja o seu próprio benefício. O problema começa a
surgir quando fazemos do favorecimento pessoal um modo de vida e a busca
suprema da nossa existência. Porque, na verdade, devemos saber que existimos
primordialmente para a glória de Deus e não para fazer ressaltar a nós mesmos.
Grandes letras de próprio punho - Paulo
começa essa última sessão e toma agora a pena da mão de seu amanuense e
resolve, ele próprio fazer o registro de suas palavras finais. Ele está
ressaltando a importância e seu interesse pessoal em que estas últimas palavras
sejam marcantes. Ele, como um pastor fortemente interessado no seu rebanho,
quer que eles saibam que existe aqui mais que um apóstolo cuidando de
interesses eclesiásticos, mas existe um servo com um interesse particular na
vida dos seus irmãos.
Os que querem ostentar-se na carne –
Paulo está fazendo uma comparação direta entre a sua atitude de interesse genuíno
na vida dos irmãos e os falsos mestres judaizantes que a única coisa que busca
é o favorecimento pessoal. A sua busca de influência não tem um interesse genuíno
de ver a igreja rendida e absolutamente em comunhão com Deus, mas manipulam as
coisas da fé para serem favorecidos pessoalmente através da igreja.
Vos constrangem a circuncidar somente para não serem perseguidos - a busca destes falsos
mestres era o de provarem aos seus compatriotas que eles também guardavam a lei
o que queriam não era uma regra de santidade para o povo de Deus, mas um escape
da perseguição, que havia se tornada intensa contra os cristãos, a quem os
judeus acusavam de incredulidade porque não guardavam corretamente a lei.
Eles que se circuncidam não guardam a lei – a prova de sua insinceridade era o fato de que mesmo guardando alguns
rituais da lei, quando a lei os punha à prova eles não a cumpriam. Paulo está falando
de uma maneira muito prática de ver a vida cristã. O fim da lei é que nos
pareçamos mais com Cristo e o critério para a avaliação mais prático era o amor
ao próximo. Entretanto, o que ele via acontecer na prática daquela igreja era o
surgimento de lutas, contendas, invejas e busca de favorecimento pessoal como
regra. Paulo está dizendo que isto somente aponta para o fato de que o
cristianismo deles estava equivocado, porque havia deixado a verdadeira
instrução, ou regra do Evangelho da Graça e partido para um outro tipo de fé,
baseado no interesse e promoção pessoal.
A verdadeira vida regrada, ou
medida pela graça (kanoni - regra) ela lança fora a busca do favorecimento
pessoal, do interesse pessoal como ponto central da vida. Quando a graça é quem
realmente conduz a nossa vida, nos transformamos em pessoas que se sentem
felizes e completos numa proposta que tem como objetivo central fazer os seus
interesses se sobressaírem. Assim, o que realmente nos move e nos faz escolher agir
de um jeito ou de outro não é o que vamos ganhar com isso e sim como é que
Cristo será exaltado nisto que faço.
O gargalo de toda o nosso
interesse não está centrado em nós, mas em Cristo. Por isso, Paulo dizia: não
sou mais eu quem vive, mas Cristo vivem em mim. A regra da graça é que lançamos
fora o interesse pessoal como ponto central de nossa busca existencial e
estamos dispostos a não sermos movidos em direção a nós mesmos.
Paulo está dizendo que este é o
que revelava a falta da graça na vida daqueles falsos mestres, que não estavam
interessados em nada senão em seus próprios interesses, o que forçosamente os
levava a viver manipulando pessoas.
A Regra da Graça Produz Vida Que Busca Um
Padrão Elevado de Esvaziamento de Si Mesmo
Mas longe esteja de mim gloriar-me senão na cruz de nosso Senhor Jesus Cristo, pela qual o mundo está crucificado para mim, e eu para o mundo. Pois nem a circuncisão é coisa alguma, nem a incircuncisão, mas o ser nova criatura. (Gálatas 6.14-15).
Longe de mim gloriar-me a não ser na cruz - O contraste deste tipo de postura centrada no interesse e
favorecimento pessoal, Paulo propõe o seu modo de pensar sobre o que é glória. Enquanto
os falsos mestres tentavam manipular a igreja para se protegerem contra a
perseguição dos judeus que viam na mensagem da cruz uma abominação. Paulo diz
que a cruz era a razão de sua glória. Vamos tentar entender um pouco mais isso.
O mundo está crucificado para mim e eu para o mundo – Paulo diz que a cruz de Cristo é o símbolo de como os valores que
controlam este mundo não mais controlam sua vida. Os interesses mundanos,
centrados no ganho pessoal e no favorecimento pessoal não são o fundamento do
modo como ele vive. Paulo está dizendo que consegue, por causa da cruz de
Cristo, aprender o valor do esvaziamento de si mesmo.
A cruz de Cristo é o mais
absoluto símbolo do auto esvaziamento. Na verdade, o Rei da Glória deixou a sua
glória para se fazer homem e morrer, a morte de Cruz, este é o mais elevado
momento do esvaziamento de Cristo e o modelo mais absoluto de como é realmente
que uma pessoa vive para Deus, destituindo-se de si mesmo para servir, como
Cristo serviu.
Nada tem valor senão o ser nova criatura
– a Lei de Deus deseja produzir um novo homem, baseado em valores do reino,
onde o maior é o que serve e se sente feliz nisto. Sim, Paulo está nos dizendo
que ele, por causa da cruz, está aprendendo o verdadeiro modelo de vida baseado
em Cristo e isso faz dele um novo homem, uma nova criatura. Ele está nos
dizendo que a regra da graça produz este novo Paulo, que não visa mais fazer
prevalecer a si mesmo, mas vê valor no ato do servir autoesvaziado.
O egoísmo é tão contrário ao Evangelho
que Paulo diz que o homem que vive de forma egocentrada vive um OUTRO EVANGELHO
QUE DEVERIA SER CONSIDERADO MALDITO.
Este pensamento que se vale do
autovalor como principio de satisfação, representado na circuncisão que era
usada como formo de autoafirmação judaica, é um pensamento que nada tem a ver
com a nova vida que Cristo busca nos dar por meio do Espírito que produz em nós
o fruto que nos capacita servir.
A regra da graça produz
satisfação no autoesvaziamento como forma de valor superior. Em outras
palavras, a graça nos faz sentir bem em fazer o bem, mesmo que isto tenha um
custo para nós. Assim como Cristo se sentiu satisfeito ao dar a sua alma como
oferta por nós, mesmo que não merecêssemos, da mesma forma, fazer o bem ao
outro, mesmo que ele não mereça é um padrão da graça e nos fará sentir felicidade.
A Regra da Graça nos Conduz à Paz
Produzida Pela Identificação Com Cristo
E, a todos quantos andarem de conformidade com esta regra, paz e misericórdia sejam sobre eles e sobre o Israel de Deus. Quanto ao mais, ninguém memoleste, porque eu trago no corpo as marcas de Jesus. A graça de nosso Senhor Jesus Cristo seja, irmãos, com o vosso espírito. Amém (Gálatas 6.16-18).
Aproveitando este ponto, Paulo
dá uma palavra final às igrejas da Galácia, apontando para a identificação com
Cristo como o ponto mais elevado da nossa tarefa de ser igreja neste mundo.
Voltando ao garrafão de Samuel
Logan, existimos para revelar a glória de Cristo em nós. Na verdade, nada será
mais eficaz para que a nossa vida aponte para Cristo que o exalar da obra da
graça em nossa vida.
Paz e misericórdia para quem anda segundo essa regra – Israel de
Deus – Paulo está usando aqui de uma certa ironia,
mas ao mesmo tempo, usando uma figura que reforça a ideia de resultados. Em
outras palavras, Paulo estava comparando os judaizantes que diziam viver segundo
as regras da Lei, mas o resultado de sua vida prática eram intrigas, facções,
invejas etc. Aqui, ele ironiza este falso comportamento que usava a lei como
cortina de fumaça para a carne e chama o verdadeiro evangelho de Kanon, regra e
medida, esta baseada na graça, que faz a vida não buscar o interesse pessoal,
mas a marca da graça como regra de vida, amor ao próximo e não autoamor como
prova de comunhão com Deus. O resultado desta vida não é supremacia de uns
sobre os outros é misericórdia e paz, isto é, gestos e tratos baseados no amor,
produzindo unidade. Esse é o Israel de Deus, assim sabemos que essa igreja
pertence a Deus e tem comunhão com ele e pertence a Ele.
As marcas de Cristo no corpo de Paulo – Faz
muito sentido que Paulo diga isto aos crentes da Galácia. Ele pregou o
evangelho àqueles irmãos sob intensa perseguição e foi preso e muito castigado
por causa disto. Certa vez, por causa da sua decisão de não abandonar as
igrejas e persistir em pregar o evangelho da salvação, que anuncia Cristo,
Paulo foi apedrejado até a morte. Nisto, o que ele fez, mostrou o seu amor
verdadeiro por eles e com isso, a graça de Deus que usou Paulo como
instrumento. Essas marcas, que ele trazia no corpo deveriam fazer os crentes se
lembrar de que era o resultado da operação da graça de Deus através da vida de
Paulo que foi o instrumento que Deus usou e marcou para salvá-los.
Quero lhes dizer, meus irmãos,
que precisamos estar dispostos a sofrer as marcas que porventura a graça quiser
infringir sobre a nossa vida, a nossa alma, nossa mente, nosso coração, para
cumprirmos cabalmente o nosso dever final de nos identificar com Cristo. São
essas marcas, as melhores lembranças que teremos para a eternidade de que nos identificamos
com Cristo.
O que realmente irá produzir em
nossa alma o sentimento de paz que Paulo tratou nestes versos não é a ausência
de lutas, mas a presença de sinais de que aprendemos e vivemos por Cristo
Jesus, fazendo o que foi necessário para ele seja glorificado em nossa vida.
A graça seja com vosso espirito – a saudação
final é mais que um adeus ou um desejo de boas coisas. Paulo está propondo uma
verdadeira presença da ação da graça no interior do coração da igreja. O que
realmente precisa acontecer em nós para que sejamos esta igreja com as marcas
de Cristo é algo que só Deus pode fazer em nossa vida, nos fazendo morrer para
nós mesmos e vivos para Cristo Jesus.
Conclusão
O que marca sua vida neste
mundo? O que é que você realmente busca ser? O que realmente te faz feliz e
completo?
Claro que quando nós nos
medimos pela graça o que vemos no final deve ser resultado da obra da graça. Às
vezes, o que vemos após a medida da graça é uma vida completamente em desacordo
e desajustada com o que a graça deveria produzir.
O que Paulo propõe é algo muito
simples, que nos conheçamos pelo próprio fruto que produzimos.
Graças a Deus nem sempre o que
temos feito e vivido é tão ruim. Muitas e muitas vezes o que fazemos e como
vivemos revela que Deus está trabalhando em nós. Creio que isto era o que Paulo
pensava sobre as igrejas da Galácia. Ele os chamou a considerar os próprios
erros e a revisar os seus caminhos.
Com este término de carta o que
percebemos é o anseio de um homem de Deus que o liga a seus irmãos com amor.
Ele que havia dado parte de sua vida para ser usada por Deus em favor daqueles
irmãos, os amava como a filhos verdadeiros no Espírito. Agora, portanto, tudo o
que ele esperava é que eles acordassem do seu sono.
Caro irmão, longe de mim tentar
fazer qualquer comparação indevida com o sentimento do apóstolo Paulo ou com a
sua ilibada conduta pastoral, mas tudo que eu desejo é andar ao lado de vocês
de mãos dadas com um único objetivo, que a regra da graça nos guie a lugares
melhores.
Podemos também estar bem
equivocados e não fazer o que a graça manda. Podemos estar construindo uma
falsa ideia de vida cristã. Por isso, eu os conclamo a buscar a Deus e se
refugiar unicamente na graça. Devemos ter como alvo um padrão de vida que foque
na glória de Cristo como alvo existencial. Hoje, vamos lançar fora toda a busca
de vantagem e exaltação pessoal, vamos nos deixar moldar pela graça a ponto de
produzir um modelo baseado no modelo de autoesvaziamento de Cristo, façamos da
graça uma marca de conduta.
Deus nos chama a confiar
somente nele e viver somente para ele!