1 de abril de 2015

Lucas 22.14 a 20

Alimentados Pela Mensagem do Reino
(Lucas 22. 14 a 20)


Foco da Nossa Condição Decaída
Participar da Santa Ceia  é mais que um mero relembrar, é uma declaração de fé e envolvimento com um Reino glorioso que é real e deve ser tornar tangível na igreja, assim como todo o significado da cruz é tangível na vida da igreja. 

Introdução
O relato lucano da instituição da ceia é diferenciado dos relatos de Mateus e Marcos. Lucas, enfatiza a interconexão entre a páscoa judaica e a santa ceia de uma maneira bastante diferenciada, incluindo um diálogo que os outros dois evangelistas não fizeram.
Os judeus tinham um grande ritual para a Páscoa. Primeiro, o anfitrião, oferecia um cálice de vinho diluído a todos os que estavam na casa, o chamado “primeiro cálice”. Após, o primeiro cálice, eles comem ervas fortemente amargas como memorial de sua escravidão no Egito.
Após este primeiro momento, um dos filhos da casa pergunta ao pai: “porque esta noite é diferente das demais”. Então, o pai lhe dá a resposta, se referindo ao anjo da morte que passou sobre o Egito e, Deus livrou o povo por causa do sangue do cordeiro que foi morto, cujo sangue foi passado nos umbrais das portas. Em seguida cantavam a primeira parte do Hallel (Salmo 113 e 114), lavavam as mãos e tomavam o segundo cálice.
Agora, com as mãos limpas do amargor, eles comiam o cordeiro, com pão ázimo (sem fermento), o chamado “pão da pressa”, feito sem fermento para expressar a urgência com que sairiam daquela terra. Enquanto houvesse carne na mesa, todos podiam comer o quanto queriam, até não restar nada do cordeiro. Se uma família fosse pequena para um cordeiro, eles convidavam vizinhos para ajuda-los. Os restos ósseos eram queimados pela manhã. Após comerem, tomavam o terceiro cálice e cantavam a última parte do Hallel (Salmo 115 a 118).
Entretanto, antes de encerrar com a última parte do Hallel, Jesus intervém e toma novamente o pão e dá aos seus discípulos e depois outro cálice, o da nova aliança. Só então, cantam a última parte do Hallel, como dizem Mateus e Marcos e saem, na direção do Getsemâni. 
A natureza da ceia é de profunda conexão com toda a história da redenção. Os judeus, estavam saindo do Egito para ser um povo livre, uma nação santa e separada para adorar a Deus. Participar da ceia, como veremos, é como cantar um hino nacional e proclamar a que pátria pertencemos ou a que rei pertencemos. É uma declaração de participação na vida do Rei que dá a vida pelos seus súditos para lhes libertar. A santa ceia é uma refeição pactual.
Nesta noite memorial, vamos buscar neste texto os ensinos sobre a natureza da nossa comunhão vital com Jesus. Nestas poucas palavras registradas do nosso Mestre, vamos buscar entendimento sobre a natureza da nossa aliança de vida feita na cruz, por meio de sua morte.

A Santa Ceia é Sinal do Cumprimento e Chegada do Reino de Cristo
A Páscoa Judaica era um símbolo que apontava para frente, a esperança de encontrar uma terra e um lugar para servir a Deus de forma plena, livre e santa. Era um grito de busca de uma promessa do Senhor. Eles comiam para sair e caminhar no deserto em direção à Terra Prometida.
A Santa Ceia, no entanto, é a refeição do cumprimento das promessas do reino, é a chegada à terra e à verdadeira liberdade. Ela não olha para o futuro reino, ela olha para o Reino Presente. Veja esta conexão nos versos 14 e 16, em particular no 16.
Chegada a hora, pôs-se Jesus à mesa e com ele os apóstolos. E disse-lhes: Tenho desejado ansiosamente comer convosco esta Páscoa, antes do meu sofrimento. Pois vos digo que nunca mais a comerei, até que ela se cumpra no reino de Deus (Lucas 22.14-16).
Chegada a hora pôs-se Jesus à mesa e com ele os apóstolos -  Lucas propõe a estrutura da páscoa, com Jesus anfitrião e os apóstolos como os convidados familiares. O aspecto familiar deste encontro, aponta para a unidade existente entre eles e o pensamento de Jesus é que eles considerem esta ligação vital.
Desejado ansiosamente comer convosco antes do meu sofrimento - Literalmente, Jesus está dizendo que se sente esmagado por sentimentos naquele momento. Ele está informando a importância daquele momento e o foco no seu sofrimento, aponta para a cruz. Ou seja, este era um momento que apontava para a cruz, como ele tantas vezes disse aos seus discípulos que haveria de ser entregue para ser morto. O sofrimento, portanto é o ponto de referência desta páscoa.
Não a comerei até que se cumpra no Reino de Deus - Este é o ponto vital para nossa exposição. Jesus, conduz a páscoa levando os discípulos a associarem a simbologia da refeição pascal com o seu próprio sofrimento. E ele também conduz os discípulos a pensarem no sofrimento da cruz com o cumprimento do Reino de Deus. Ou seja, Jesus aponta que o símbolo dará lugar ao realizado e à realidade.
Corpo e Sangue entregue e derramado - A Santa Ceia, na mesma direção, aponta para o sofrimento. As expressões corpo e sangue, entregue e derramado, apontam para sua morte. Morte vicária, morte substitutiva, mas morte salvadora. Os discípulos deveriam interligar a Páscoa Judaica, com a morte de Cristo, simbolizada agora neste novo pão e novo cálice. Por isso, mesmo, por ser novo no ritual pascal, Jesus aproveita para denominar nova aliança no meu sangue.
Esse novo cálice é o cálice do cumprimento do Reino. Porque o sofrimento, a entrega do próprio Jesus é o início deste reino. A Santa Ceia é portanto não cruenta, como  o sacrifício do cordeiro pascal judaico, porque é uma lembrança mansa, cheia de paz. Não olhava mais para frente, mas para trás. O REINO ESTÁ ENTRE NÓS, PORQUE O CORDEIRO DE DEUS FOI MORTO.  Por isso, Apocalipse, quem está no trono é o CORDEIRO QUE FOI MORTO.
Quando estamos juntos para a Santa Ceia estamos celebrando o Reino ao qual pertencemos, o Rei a quem servimos e declarando nossa lealdade, nossa vinculação. O reino se cumpriu e está se cumprindo a cada dia, até que  ele volte.

A Santa Ceia é Sinal da Unidade Cristã Em Cristo
Já falamos um pouco sobre o ambiente familiar pretendido nesta ceia pascal. Numa alusão à reunião familiar do Êxodo, Jesus desejou mostrar aos seus discípulos essa unidade entre Ele e seus apóstolos.
À mesa e com ele os apóstolos - Lucas prefere a palavra “apóstolos” à “discípulos”, pensando na ideia de que a igreja que haveria de ler este texto saberia que aqueles que foram enviados a pregar o evangelho tiveram comunhão pessoal com Cristo. Na verdade, Lucas quer que a Igreja perceba essa unidade, essa proximidade do Senhor com sua igreja, por meio da Palavra pregada pelos apóstolos.
Comer convosco - neste ponto, fica claro o princípio pactual desta unidade familiar. Lembremo-nos que estar à mesa era um sinal fundamental de unidade pactual:
Como é bom e agradável viverem unidos os irmãos! (Salmo 133.1).
A expressão do salmista, traduzida por “viverem unidos”, é “sheveth”, isto é “sentar” em uma clara referência às refeições pactuais do antigo testamento. Jesus, está à mesa com os seus apóstolos e está celebrando esta unidade de muitas formas.
Recebei e reparti entre vós - Essa unidade é repartida, todos devem comer porque todos são parte da família. Essa unidade não é apenas entre Jesus e cada um dos seus apóstolos, mas entre todos, ele e nós, nós e nós, nós e ele.
Neste mesmo sentido, a Santa Ceia que se segue, dentro do mesma refeição é o novo pacto. Como se Jesus estivesse nos deixando a ideia de que aquela refeição seria, agora, completada nesta, que teria como base, não mais uma promessa a ser alcançada, mas uma promessa realizada no seu sofrimento. Todo o texto, gira em torno do sofrimento como ponto central e culminante para a chegada do Reino.
Não mais comerei até que se cumpra no Reino - A Santa Ceia apontava para este cumprimento. Antecipadamente ainda, mas com a força de que a hora estava tão próxima que era considerada “chegada”.
A unidade cristã é o que celebramos na Santa Ceia. Unidade em Cristo e com Cristo. Unidade feita pela entrega de seu corpo e o derramamento do seu sangue. Devemos fortalecer nossa unidade a cada participação na ceia, pois nela temos os mesmos ideais de vida e a mesma esperança vindoura.

A Santa Ceia é Sinal do Compromisso Cristão
Quando Lucas escreve este texto, está propondo à igreja  que conheça os valores implícitos nessa declaração de unidade e pertencimento ao Reino e seja movida por essa consciência.
Eles deveriam perceber que os grandes recipientes dos resultados da cruz eram os filhos da fé, aqueles que, pela fé, creram que Cristo Jesus havia morrido por eles. Duas expressões nos ajudam grandemente a entender a nossa responsabilidade: “oferecido por vós” e “derramado em favor de vós”.
Oferecido por vós - na primeira expressão, Jesus enfatiza o seu ato e o seu amor. Ele deixa claro que o seu sofrimento é voluntário e o  seu corpo é entregue, ou oferecido por ele próprio, por nossa causa.
Derramado em favor de vós - a segunda expressão é distinta da primeira e aponta para o sangue como “derramado”, não uma ação voluntária, mas uma ação exigida. Era o preço exigido por quem direito: Deus. E isto, porque Deus estava interessado na morte de Cristo, por causa da igreja.
Precisamos levar muito à sério as implicações que Jesus quer dar a estas palavras, assim como Lucas as percebeu e logo apontou para que a igreja refletisse sobre ela.
Seguindo a teologia paulina que indica uma forte interligação entre a morte de Cristo e a vida do crente. Como em Romanos 6, por exemplo podemos ler:
Ora, se já morremos com Cristo, cremos que também com ele viveremos, sabedores de que, havendo Cristo ressuscitado dentre os mortos, já não morre; a morte já não tem domínio sobre ele. Pois, quanto a ter morrido, de uma vez pára sempre morreu para o pecado; mas, quanto a viver, vive para Deus. Assim também vós, considerai-vos mortos para o  pecado, mas vivos para Deus, em Cristo Jesus (Romanos 6.8-11).
Precisamos compreender e atender à todas as implicações da morte vicária de Jesus e de nossa nova vida, a qual ganhamos para o fim de servir e viver para ele como filhos de um Reino inaugurado e santo.
A ceia é este sinal para mim e para você. Cada vez que participamos dela, reafirmamos este compromisso de vida e serviço no reino e reafirmamos nosso compromisso vital  com Cristo.
É uma contradição de termos quando participamos da Ceia e não da construção do Reino. Paulo diz que isso é não discernir o corpo.

Conclusão
A Santa Ceia, portanto, não é apenas uma ação simbólica apontando para a Cruz de uma forma estática. Ao contrário, ela é um sinal vivo de nossa nova vida em Cristo, um memorial que nos diz que a Cruz é o começo de uma nova sociedade que se refaz no pleno conhecimento de Cristo e está vivendo nesse mundo caído com o propósito de sinalizar a realidade e atualidade do reino.
Nosso compromisso com Cristo é de sermos filhos do seu Reino e viver de modo digno disto. Também é um compromisso de unidade uns com os outros, isto implica em nos dedicarmos, cada dia mais pelo bem mútuo.
Eu acredito na igreja como uma força transformadora de dentro para fora. Uma força transformadora que ajuda as famílias que se achegam a nós a se reerguerem, que nos qualifica  uns para ajudarmos aos outros como irmãos, o que de fato somos no sangue de Jesus.
A Santa Ceia tem uma conotação prática de luta por um mundo cheio da mensagem que lembra Jesus. Em memória de mim, é mais que apenas uma indicação de algo passado, mas nos  faz visualizar o mestre e o seu Reino que está sendo construído na igreja, dentro de nós e será total neste mundo quando ele voltar.



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