A Paz do Cristo Ressurreto
(Lucas 24. 36 a 20)
Foco da Nossa Condição Decaída
Um dos fatos dos evangelhos que foi ressaltado no final de todos eles é a incredulidade dos apóstolos. O desfrutar pleno da comunhão com o Cristo ressurreto é uma construção e, no Evangelho de Lucas, isso aponta para o fato de que precisamos amadurecer este relacionamento vivo com o Cristo vivo.
Introdução
Ler os quatro evangelhos é uma experiência riquíssima, porque a história de Jesus é repleta de fatos significativos. Mas, a simples leitura do evangelho pode não ser suficiente para desenvolver um relacionamento de vida com esta história de Jesus.
Eu parto do princípio de que os fatos narrados nos evangelhos têm um propósito muito superior ao de apenas informar o que aconteceu com Jesus. Eles foram registrados para que nossa fé fosse alimentada por estas histórias.
Lucas em particular, escrevendo para um mundo gentílico, onde a igreja passava por uma intensa e constante pressão do mundo externo, diz que escreveu esses fatos com o objetivo de nos fazer plenamente certos do fundamento ensinado por Cristo e seus apóstolos.
Neste capítulo 24, onde Lucas trata da ressurreição de Jesus, algo me chama a atenção, pois Lucas parece começar um relato crescente das aparições de Jesus. Ele começa com as mulheres, como já ouvimos noutro sermão, que não tinham credibilidade em tribunal para serem as primeiras a apresentarem a mensagem do Evangelho.
A seguir, ele mostra o encontro de Jesus com dois discípulos, que não fizeram parte daquele conhecido colégio apostólico dos onze, para somente no final do capítulo conduzir os onze à uma consciência verdadeira da sua ressurreição.
Desde o início, quando os anjos apareceram às mulheres, Lucas nos informa que elas informaram os onze sobre a ressurreição de Jesus. Ou seja, parece que o encontro de Jesus com os onze era o objetivo do capítulo, mas ele é apresentado como uma crescente, inclusive nos informando que Pedro já havia encontrado Jesus também antes disto.
O ponto que quero abordar com essa a partir desta percepção é que a relação dos onze com o Cristo ressurreto foi um ato progressivo. Ou seja, o desenvolver de uma relação vital com a o Cristo ressurreto não deve ser visto apenas como um ato, mas como um processo de amadurecimento, reconhecimento, aproximação.
Muitas vezes, não notamos que deve existir um alvo para a nossa vida cristã e este alvo é o desenvolvimento de uma vida plenamente ressurreta. Essa foi a teologia que o Apóstolo Paulo insistiu em mostrar aos crentes de sua época ao dizer-lhes que devemos ter uma vida digna do Evangelho, do nosso chamado, um viver ressurreto, segundo a ressurreição que temos em Cristo.
Eu convido você a olhar para este texto com este desejo, o de desfrutar de um modelo de vida de intimidade com o Cristo ressurreto, dando os primeiros passos, como os onze deram, para que pudessem realmente desfrutar a paz de uma vida ressurreta.
Amadurecemos Nossa Vida Ressurreta Quando Amadurecemos Uma Relação Pessoal Realista e Concreta Com o Cristo Ressurreto
Não é possível nenhum desfrutar da Paz da Vida Ressurreta sem um relacionamento pessoal e direto com o próprio Cristo Vivo. Você pode estar pensando: mas isto é óbvio! Contudo, não são poucos os crentes que possuem uma vida cristã de relacionamento intenso com o Cristianismo, mas sem Cristo.
Michael Horton produziu uma obra, cujo título é “Cristianismo Sem Cristo”, na qual descreve a tendência moderna de termos todos os elementos éticos, sociais e até eclesiológicos do Novo Testamento, contudo deixar de lado a verdadeira fé que nos aproxima prioritariamente da pessoa de Jesus Cristo.
Falavam ainda estas coisas quando Jesus apareceu no meio deles e lhes disse: Paz seja convosco! (Lucas 24.36).
A discussão que travavam naquele momento era sobre a notícia que os dois discípulos de Emaús traziam de seu encontro com Jesus. Eles estavam focados nas histórias sobre a ressurreição, pois ainda tinham na mente o relato das mulheres e de Simão, bem como, eles já deviam ter conhecimento da história pessoal de Maria de Magdala. Enfim, apesar destes testemunhos, como vemos no próprio texto, eles ainda assim não tinham um relacionamento vital com o Cristo Vivo, ele ainda lhes era um estranho.
Jesus apareceu no meio deles - Lucas diz que ele se posicionou (estei - istemi) no meio deles (mezou). Lucas está dando aos seus leitores a informação de que Cristo se posicionou realmente entre os discípulos, esteve com eles de forma física. Embora, o texto pareça indicar que ele fez isto de uma forma repentina, o que favorece o fato deles pensarem ser um fantasma, Lucas deseja que todos saibam que Jesus esteve presente entre eles.
Era necessário um relacionamento pessoal e direto com Cristo para a construção da verdadeira experiência com o Cristo ressurreto. Não poderia ser apenas uma percepção intelectual da história.
Paz seja convosco - quando, entretanto, fala “paz seja convosco”, Jesus mostra o alvo de sua aparição ressurreta, ou seja, que seu relacionamento com os discípulos construísse no coração deles uma certeza que os levasse a descansar na vontade e plano de Deus.
Jesus pessoalmente desejava que todo o temor e incerteza do coração dos seus discípulos fossem dissipados por que eles viriam a ter um relacionamento pessoal e direto com o Cristo Vivo. A vida de Cristo deve nos fazer confiantes, a sua ressurreição é a certeza da nossa própria ressurreição.
Sei que, muitas vezes, é difícil pensar em uma felicidade plena se as coisas não forem do nosso jeito ou se não forem segundo as regras que já estamos acostumados neste mundo. A ressurreição de Jesus é uma alteração do caminho natural e a revelação de um caminho espiritual, mais elevado e consistente, fundamentado no fato de que Ele venceu a morte, segundo a eficácia do poder de Deus.
Maior é o que está conosco que o que está no mundo. Mas, certezas deste tipo, que nos movem a confiar em Deus e seus caminhos mais que em nós mesmos e nossas escolhas, só pode se tornar realidade quando nossa mente considerar que CRISTO REALMENTE ESTÁ VIVO.
Infelizmente, para muitos cristãos, o fato de Cristo estar vivo não modifica em nada o seu viver, não altera o seu padrão de comportamento, eles não notam que tendo um Cristo vivo como seu Senhor, ainda vivem segundo o curso deste mundo morto.
Por outro lado, podemos construir essa relação de vida ressurreta com o Cristo vivo, na medida em que começamos a nos conscientizar sobre a importância de levarmos a sério a realidade e concretude de sua ressurreição.
Isso nos dará maturidade cristã e uma vida ressurreta que seja eficaz para moldar nosso modo de andar neste mundo.
Amadurecemos Nossa Vida Ressurreta Quando Vencemos as Inconstâncias do Coração
Evidentemente, os discípulos tiveram muita dificuldade com aquele momento. Não sabiam o que crer. Se você notar o texto, eles saem do medo, da tristeza para a alegria e admiração, sem contudo nenhum destes extremos os conduzirem à verdade da realidade e concretude do Cristo Vivo.
Eles porém surpresos e atemorizados, acreditavam estarem vendo um espírito. Mas ele lhes disse: Por que estais perturbados? E por que sobrem dúvidas ao vosso coração? (Lucas 24.37-38).
Muitas vezes nosso maior inimigo está dentro de nós mesmos, o nosso próprio coração. Pois, o nosso coração, inclinado a confiar apenas em si mesmo, por causa do pecado que nos afasta de Deus, não consegue descansar na paz de Cristo e busca outros critérios para se sentir em paz.
Essa dificuldade do coração é que tem transformado a vida de tantos crentes em uma gangorra da fé, ou seja, hora lá em cima, outras vezes, lá embaixo. O amadurecimento da nossa vida ressurreta exige que vençamos essa inconstância da nossa fé.
Surpresos e atemorizados acreditaram errado - o coração dos discípulos usou de um recurso muito comum do coração caído, ou seja, sentimentos profundos que os levaram a um desvio da realidade do Cristo Vivo.
Ele estava ali, real e concreto no meio deles e estavam propondo-lhes paz, mas o coração deles os desvia dessa realidade para considerarem com mais força a possibilidade de estarem diante de um fantasma.
A palavra “pionthentes”, traduzida por “surpresos”, indica um mover no pensamento que diminuiu a capacidade de avaliar, levando ao erro de juízo. Era como se Lucas estivesse dizendo que o medo e a inclinação do pecado no coração os levasse a se desviar da verdade do Cristo vivo ali com eles.
Mas você sabe que é mais fácil ter um coração se desviando de realidade e concretude da vida ressurreta que se manter firme na verdade. Pois, muitas vezes, também nós somos tentados a não confiar na verdade e nas implicações práticas da ressurreição da nossa vida. Para nosso coração, muitas vezes, é difícil confiar, por exemplo, que o perdoar o próximo é mesmo o melhor caminho e o caminho do ressurreto e nos mantemos na falha de juízo, fechando o nosso coração para tal.
Estais perturbados e sobem dúvidas ao coração - Lembrando as palavras de Jesus que antes haviam sido ditas aos discípulos: Não se turbe o vosso coração, crede em Deus, crede também em mim... A minha paz vos dou, não vo-la dou como o mundo a dá, não se turbe o vosso coração, nem se atemorize.
Com certeza, Jesus sabia que era necessário construir a confiança dos discípulos e por isso havia aparecido aos onze neste momento, com a intenção de que fossem completamente transformados. O ponto em que Cristo quer trabalhar é na inconstância do seu coração para crer. E por isso, ele quer que eles trabalhem a própria consciência ao se perguntarem: porque estais perturbados? e porque sobem dúvidas ao vosso coração?
Precisamos lidar com nossas imperfeições e precisamos confrontar o nosso próprio coração. O salmista fez isso quando disse à sua alma: Por que estás abatida dentro em mim, ó minha alma? Você deveria se perguntar: por que estou agindo assim? Por que estou escolhendo este caminho? Por que não confio no Senhor como deveria?
Na verdade, Jesus está lidando com a inconstância da nossa fé de uma maneira construtiva, visando o amadurecimento da nossa vida ressurreta. Foi isso o que ele fez com os seus apóstolos, por isso, antes de lhes mostrar as mãos e o lado e comer com eles, ele lhes fez pensar sobre o quão fraca era a sua fé e como eles se deixavam guiar pelo coração inconstante.
Precisamos fazer o mesmo caminho se desejamos construir uma relação verdadeira e ter a Paz do Cristo Vivo amadurecida em nós e viver neste mundo como ressurretos. Precisamos encarar a inconstância da nossa fé.
Amadurecemos Nossa Vida Ressurreta Quando Cedemos Mentalmente à Realidade e Concretude do Cristo Vivo
Lucas prefere não fazer diferença entre Tomé e os outros dez discípulos. Antes, os colocou todos em pé de igualdade, pois, na verdade, todos e não somente Tomé tiveram dificuldade para crer na realidade e concretude do Cristo vivo.
Neste ponto, Lucas parte para o modo como Jesus venceria a sua incredulidade de forma concreta, estimulando sua mente por meio da observação realista de que ele de fato estava ali e não era um fantasma, ou qualquer figura imaginária. Ele os deixará tocar em suas feridas e mesmo comerá com eles.
Vede as minhas mãos e os meus pés que sou eu mesmo; apalpai-me e verificai, porque um espírito não tem carne nem ossos, como vedes que eu tenho. Dizendo-lhes isto, mostrou-lhes as mãos e os pés (Lucas 24.39-40).
Os discípulos precisavam que suas mentes fossem estimuladas pela realidade e concretude de Cristo e Jesus o fez por meio de uma experiência sensorial com eles. Ou seja, o tato, algo que eles não poderiam negar, serviu como ferramenta para a mudança da sua mente, jazida na incredulidade até então.
Quando João relata sobre Tomé, ele reafirma essa necessidade ao relatar que Tomé havia dito que “...se eu não tocar nele, nas suas feridas de modo nenhum crerei”. Ao mesmo tempo, o próprio apóstolo do amor adverte, nas palavras inquiridoras de Cristo: “porque vistes crestes, bem aventurados os que não viram e creram”.
Você pode notar que a experiência sensorial com Cristo não deveria ser o caminho natural, mas Cristo sabia que esta era uma maneira de conduzir o coração dos seus discípulos.
O que Lucas faz a seguir é mostrar o quanto conduzir o coração do homem para a realidade e concretude de Cristo é difícil. Pois, ele relata que mesmo assim, eles ainda não estavam crendo, porque, novamente o seu coração os levara à incredulidade, agora pelo excesso de euforia.
E, por não acreditarem eles ainda, por causa da alegria, e estando admirados, Jesus lhes disse: tendes aqui alguma coisa que comer? Então, lhe apresentaram um pedado de peixe assado e um favo de mel. E ele comeu na presença deles (Lucas 24.41-43).
Não é à toa que um pouco antes, o texto nos diz que Jesus afirmou a dificuldade do coração dos discípulos, quando repreendeu os dois do caminho de Emaús ao lhes chamar de nescios e tardos de coração.
O toque em suas mãos e pés, ver-lhes as feridas não fora suficiente para ter as suas mentes incendiadas pela realidade e concretude de Cristo. Eles ficaram admirados, mas não crentes.
Muitas vezes, caímos nos mesmos erros, pois nos admiramos do Cristo que parece tão poderoso, mas ele mesmo continua distante de nós. Precisamos ceder mentalmente à realidade e concretude de Cristo.
Ele faz o mesmo processo em nós, sem que precisemos tocar as suas feridas ou vê-lo comendo. Ele faz isso, nas muitas vezes que nos mostrou seu poder agindo em nossa vida, agindo na vida dos que estão ao nosso redor. Mas, ainda assim, parecemos tantas vezes resistir à vida amadurecida, por que simplesmente, não cedemos mentalmente à sua realidade e concretude.
Ceder mentalmente é descansar em Cristo mesmo sem que seja necessário ele aparecer pessoalmente aqui. Ceder mentalmente é considerar a partir das próprias experiências com Deus e com a sua Palavra que o que estamos vivendo na fé cristã é real e concreto. Que podemos mesmo esperar que ele voltará e por isso, devemos também viver de forma santa a nossa peregrinação nesta terra.
Você não escolherá o caminho de Deus enquanto não ceder mentalmente ao fato de que Ele Vive e tem um jeito certo para você viver a sua vida, que não pode ser determinada pelo pecado nem as inclinações do seu coração caído.
Conclusão
Meus irmãos, o propósito deste Evangelho, como de todos os escritos do Novo Testamento é nos mostrar a importância de uma vida ressurreta, que redunda em atos de justiça e retidão dignas do Evangelho.
Em meio ao mundo caído e essa sociedade tão apodrecidas pelo pecado em geral, a ganância, o engano, o egocentrismo etc.. Necessitamos elevar o padrão do modo como vivemos neste mundo, para que o mundo olhe para o nosso modo de vida e glorifique a Deus. Será que a igreja e os cristãos podem mesmo chamar a atenção do mundo, quando ela não vive o padrão ressurreto?
Do que realmente estamos falando? Estamos falando de um fato que deveria determinar nossa maneira de viver, que é o fato de que Cristo está vivo e assentado no Trono. Ele é que deve ser obedecido e para ele é que nós vivemos de forma submissa, segundo o seu padrão.
Fechar os olhos para isto e viver como se não fosse real e concreto o seu governo sobre as coisas é um ato de grande incredulidade e uma temeridade para quem assim vive. Por outro lado, uma certeza podemos derivar dessa realidade e concretude: Sabemos que tudo coopera para o nosso bem, porque nada poderá nos separar do amor de Deus que está em Cristo Jesus e se ele está vivo, cuidará de nós.
Não vivemos neste mundo por vista, vivemos por fé!
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