24 de março de 2016

Marcos 15.34

“O Desamparo de Cristo e o Amparo de Deus a Nós”

(Marcos 15.34)

(Sermão Pregado na IP Peniel, por ocasião do culto das Sete Palavras da Cruz - Março –2016)

Foco da Nossa Condição Decaída

A reação do Salvador na Cruz de agonia quando o Pai lhe dá as costas e lança sobre ele a solidão divina, o desamparo, deveria nos fazer repensar sobre a loucura da nossa maligna atitude de distância em relação a Deus e valorizar cada segundo de nossa pessoal comunhão com o Pai Celestial).

Introdução

Tenho poucos minutos para me dirigir aos irmãos na intenção de lhes falar a respeito da frase mais dolorosa de toda a história humana. Nenhum grito dor ou horror pode superar este brado do Salvador.
Nossos mais terríveis gritos de medo ou espanto são reações de pecadores ao exercício do pecado no mundo. Mas o horrendo grito “Eloí, Eloí, Lama Sabactani” - “Deus meu, Deus meu, porque me desamparaste?” é a expressão mais profunda do terror daquele que é perfeito, para quem e por meio de quem todas as coisas foram feitas, aquele que nunca jamais experimentara um microssegundo sequer de distância do Pai. É o horrendo grito de quem realmente sabia discernir que no vácuo da comunhão, o inferno do DESAMPARO DIVINO é lançado sobre o domínio da alma.
Nos poucos minutos que tenho, preciso deixar de lado muitas coisas importantes a respeito de todo o quadro em torno deste horrível brado, como, por exemplo, o fato da própria natureza reagir com trevas e terremotos. Este grito, como disse o profeta: ABALOU O MUNDO.
Vamos, portanto, caminhar em um processo de identificação direta entre Ele e nós. Entre o desamparo dele como a chave do nosso amparo. Procuraremos aprender com o seu grito de horror e buscar uma mentalidade cristã que nos faz valorizar a comunhão com Deus a cada segundo.
Diante da Distância e Desamparo de Deus, Cristo se Apegou à Sua Fé

Enquanto, tantas vezes, nos acostumamos a ver irmãos na fé que vão perdendo a comunhão com Deus se tornando frios em sua fé. Sim, os vemos deixando de lado o progresso de sua santidade, murmurando sobre tantas coisas, às vezes até condenando a Deus por supostamente tê-las abandonado, quando olhamos para a Cristo na Cruz e o  profundo desamparo que aterrou a sua alma, o que vemos é um homem que busca na sua fé a reconciliação.
O texto grego original não tem pontuações. Portanto, boa parte das vezes, os tradutores supõem estas pontuações que hoje nos auxiliam tanto na leitura em  português.
Com certeza, algumas vezes, restam dúvidas sobre o sentido original e precisamos reavaliar um pouco estas questões. No entanto, a frase que temos diante de nós não tem equívocos, o brado de dor é uma pergunta, pois o salvador usa uma das palavras que os judeus aprendem a usar deste pequenos: “Lama” - Por quê?”.

Elohin, Elohin, lama sabactaní - Em sua fé ele não questionou a decisão de Deus, mas queria saber o que estava causando aquilo, ele buscava a reconciliação. Era algo novo, jamais experimentado. Ele nunca, nem sequer por um microssegundo havia experimentado a face de Deus oculta a seus olhos, sua oração lançada em uma cinzenta nuvem de incerteza, ele jamais havia experimentado a vida sem Deus e agora, o que ele mais quer é a reconciliação, o que devo fazer?

Porque me desamparaste - Marcos deu sua interpretação e usou o verbo “katalipo” - jogar no esquecimento ou deixar para trás. O que é uma interpretação da palavra “sabactani” (em aramaico) que é da raíz shobeq, deixar só, ou separar.
O Mestre sentiu a dor de ficar só e sem Deus. Não foi à toa que se preocupou tanto com as pessoas que estavam perdidas como ovelhas que não tem pastor. Ele naquela cruz sentiu o peso de estar sem Deus no mundo.
Ele experimentou a vida sem Deus e percebeu a dor que esta morte causa. Ali, o Salvador teve sua primeira morte, a morte espiritual, quando o inferno caiu sobre ele. Até mesmo o malvado Caim sentiu o peso insuportável do desamparo:
És, agora, pois, maldito por sobre a terra, cuja boca se abriu para receber de tuas mãos o sangue de teu irmão. Quando lavrares o solo, não te dará ele a sua força, serás fugitivo e errante pela terra. Então, disse Caim ao Senhor: É tamanho o meu castigo, que já não posso suportá-lo (Gn 4.11-13).
Diante de um quadro terrível de desamparo, de morte, de dor indescritível, de alma sendo corroída pela ausência de Deus, o Salvador buscou socorro no “seu Deus”: Deus meu.
Ele apelou para as relações pactuais. É verdade, que agora ele não clamou “Pai”. A comunhão tinha sido rompida, mas ele buscava retomá-la pelas promessas pactuais: “eu serei o seu Deus e vós sereis o meu povo”, então, na certeza de que este era o único caminho, bradou: “Deus meu”! Enfático repetiu: “Deus meu”!

O Nosso Amparo
“Por que me desamparaste” é um grito de dor e de fé. Mas há um outro desta realidade. Quando Jesus bradou sua dor e seu desamparo, ao mesmo lado, ali na Cruz, Deus estava reconciliando consigo mesmo o mundo.
O desamparo de Cristo abriu caminho para o nosso amparo. Aparentemente, enquanto voltava as costas para seu Unigênito, Deus começou a olhar para nós.
A pergunta do profeta Naum estava sendo respondida:
Quem pode suportar a sua indignação? E quem subsistirá diante do furor da sua ira? A sua cólera se derrama como fogo, e as rochas são por ele demolidas (Naum 1.6).
Ali na cruz estava Cristo, sofrendo o desamparo e a  cólera de Deus. Também ali na cruz estávamos nós, mas a ira que se destinava a nós passou ao largo, como o anjo da morte que passou por sobre as casas dos hebreus no Egito. A cólera de Deus, que deveria ser derramada sobre nós caiu sobre ele:
O castigo que nos trás a paz estava sobre ele e pelas suas pisaduras fomos sarados (Isaías 53.5b).

Eloí, Eloí, Lama Mishan
Deus meu, Deus meu, porque me amparaste. Era o meu pecado, minha sentença, minha morte. Por que me amparaste? Davi cantou a misericórdia e a graça do Senhor e assim se expressou:
Assaltaram-me no dia da minha calamidade, mas o Senhor me serviu de amparo (2Samuel 22.19).
Deus me amparou porque me amou. Ele viu a justiça de Cristo em mim, no mesmo momento em que viu a minha maldição sobre ele. Ele, que nada devia ao tribunal de Deus, por amor, me abriu o caminho e o Pai, também por amor, julgou-me no seu filho.
Aquele que não conheceu o pecado, ele o fez pecado por nós;  para que, nele, fôssemos feitos justiça de Deus (2Coríntios 5.21).
Ele te amou, como me amou, por isso, desamparou seu filho. Jesus deu a vida para que nós que não éramos filhos, fôssemos feitos filhos de Deus.

Conclusões
Muitos outros aspectos são preciosíssimos para todos nós. Este brado de dor e de fé é uma inundação de graça e ensinos para todos nós. Destacamos dois aspectos que queremos que todos reflitam sobre eles.
Primeiro, quando você se sentir distante, solitário até mesmo na sua relação com Deus, nunca se deixe caminhar para ainda mais longe de Deus. Grite para seu Deus, busque com fé. Confie nas promessas! Lembre-se, aquele que deu a vida por você o fez para que nunca você ficasse desamparado.
Pense no valor do amparo de Deus. Pense no preço que foi pago e valorize sua vida com Deus. Crentes que não têm uma percepção clara do amor de Deus e do preço que sua vida custou para Filho e para o Pai evidentemente são incapazes de se santificar e dedicar tudo a ele. Estes verão a vida como qualquer homem comum.
Mas o crente que entende que o desamparo de Cristo é a porta de abraço de Deus sobre a sua vida e responde com fé a este amor, certamente não viverá mais do  mesmo jeito, saberá que sua vida pertence a Cristo e viverá para ele.
Eloí, Eloí, Lama Mishan - Porque me amaste! Agora eu me rendo.


“Porque eu, mediante a própria lei, morri para a lei, a fim de viver para Deus. Estou crucificado com Cristo. Logo já não sou eu  quem vive, mas Cristo vive em mim e esse viver que, agora, tenho na carne, vivo pela fé no filho de Deus, que me amou e a si mesmo se entregou por mim”.

(Gálatas 2.19-20).

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